quinta-feira, 6 de maio de 2010

Amor [2] - um quadro perfeito.

Ela acordou feliz. Tinha sonhado com ele, além disso era sábado, o dia tão esperado. Foi quando ela viu o computador e o celular descarregado e se sentiu muito culpada. Imaginou se ele teria ligado muitas vezes, ou esperado muito tempo no msn. E correu para o telefone fixo. Esperava realmente que ele não atendesse tão irritado e aceita-se suas sinceras desculpas.
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Acordou com o barulho do telefone. Estava irritado. Estava sonhando aqueles sonhos dos quais não gostaria de acordar nunca e mesmo assim atendeu, porque podia ser ela. Ouviu suas desculpas cheias de amor, contou sobre o dia anterior e perguntou sobre a tal surpresa tão esperada do dia. Deu aquela risada gostosa que ela adorava ouvir e foi sorrindo tomar seu banho com a preguiça da manhã, cantarolando como no dia anterior.

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Desligou o telefone, e pulava de alegria. Pôs uma música no computador e foi arrumar a casa, numa felicidade que encantava quem a avistasse pela janela. Organizou as telas as tintas e os pincéis na sala. Saiu pra comprar comida e outras necessidades da casa. Voltou ,olhou o relógio e comeu apressadamente, pois ele ia chegar e ela precisava tomar banho e conferir se tudo estava perfeito de novo, paranóia de mulher.

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Terminou o banho feliz. Se vestiu com uma roupa qualquer e foi almoçar. Satisfeito com o resto do dia que o esperava decidiu se trocar. Foi pro guarda-roupa e vestiu a camisa azul preferida de ambos. Escolheu uma bermuda de cor clara pra combinar, e foi se olhar no espelho. Se perfumou, passou um gel, conferiu no espelho de novo e saiu. Pegou um táxi e perguntou-se se estaria parecendo um feliz abobalhado. Tentava imaginar as surpresas e se perguntava também se algum dia teria sido tão feliz. Parou na floricultura pra levar-lhe flores, imaginando seu sorriso e como ela o elogiava por isso. Estava ansioso.

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Saiu e pegou o relógio. Torceu para que ele se atrasasse e foi escolher uma roupa, imaginando como era difícil escolher uma roupa que não a deixasse bonita demais para estar em casa.Demorou mas acabou optando por um vestido. Era leve, colorido e acentuava suas curvas de modo sutil. Foi conferir tudo de novo. Voltou ao quarto para se perfumar. Olhava-se no espelho fazendo mil penteados diferentes, todos ruins. Imaginava que gostaria de ser tranquila como ele aparentava. Ouviu um barulho de carro estacionando e uma porta batendo. Se olhou no espelho, soltou o cabelo e foi correndo até ele.

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Desceu do táxi, pagou o motorista e quando menos esperava viu-a se jogar em seus braços. Soltou aquela risada estrambólica e encheu-a de beijos entregando as margaridas. Se sentia realmente importante e invejado com todos aqueles olhares curiosos da rua. Era definitivamente um homem feliz.

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Agora sim estava radiante. Levou-o até a porta e pediu que esperasse. Foi buscar uma venda já que ele era bem maior que ela e ela não ia conseguir vendar seus olhos com as próprias mãos e aproveitou pra pôr as flores na mesa de centro. Vendou-o e o fez entrar. Sentou-o no sofá de frente pros materiais de pintura.

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Ele estava curioso.Vendado tentou adivinhar algo pelo cheiro do ar, mas como era tudo desconhecido ali procurou relaxar. Sentou-se no sofá e ao abrir novamente os olhos se deparou com materiais de pintura. Ficou mais curioso ainda e com seu bom humor disse: "- Essa é a parte que você tira a roupa e eu te desenho de dois ângulos diferentes?"

Ela riu e respondeu:
"-Não seu bobo. É que eu pensei, como somos amantes da pintura, nada melhor que cada um ganhar um quadro feito do outro. Você não precisa me desenhar, nem me agradar é só pintar."

Ela dividiu os materiais e foi pro outro lado da sala começar sua obra.Iniciou sua pintura de pronto. Como a idéia tinha sido dela é óbvio que ela já tinha pensado no que fazer. Usava todas as cores tentando não ser perfeccionista demais dessa vez.

Ele ficou pensativo. Desfrutava de um vórtex de lembranças em sua mente, com os mais variados sentimentos. Os sonhos, os beijos, os carinhos, os gostos dela... dominavam sua mente. Acabou por usar só a tinta preta.


Demoraram horas. Mas terminaram praticamente juntos.

Ela mostrou sua obra primeiro. Era um casal de velhinhos vistos de uma janela.Eles estavam de mãos dadas e sentavam perto de umas flores, na varanda de uma casa de madeira, vendo um pôr-do-sol no mar. Ela chamou o quadro de futuro.

Ele sorriu e disse:
"- Incrivelmente você continua desenhando e pintando melhor que eu e meus bonequinhos de palitos."

Ela riu e pediu pra ver o quadro dele. Ele colocou na mesa de centro ao lado das flores que havia dado. Era todo preto, a não ser por uma porta branca que se sobressaltava no meio da pintura.

Ela sentou no colo dele e disse:
"-Me sinto... Ahnnn... Quadrada."

Ele beijou sua cabeça carinhosamente e disse:
"-Boba. Antes de te conhecer, passei por muitas decepções. Cheguei a acreditar que estava desgraçado a ter uma vida de coração destroçado. Por mais que eu me encantasse, quanto eu mais parecia estar perto de ser feliz eu voltava a escuridão. Cheguei a ter até mesmo dias de insônia em que procurava a claridade da lua para que não me sentisse tão só e infeliz. Quando você apareceu me enchi de expectativas e medo. Desejaria a morte do que estar tão perto de ser feliz e cair como Ícaro de novo. Estava cansado. Você pra mim é tudo que está por trás daquela porta, atrás da escuridão. Me pergunto sempre se já fui tão feliz quanto quando estou com você. Me pergunto se suportarei voltar à escuridão de novo."

Ela estava com os olhos cheios d'água e o almadiçoou por ainda ser melhor com as palavras do que ela, enchendo-o de beijos em seguida. Foi o primeiro dia em que eles se pertenceram de corpo e alma. Foi o primeiro dia em que as cores se misturaram de verdade, a alegria radiante dela penetrou na alma dele assim como o preto e branco clássico dele faziam agora parte essencial dela.

E isso era o que as pessoas desde tempos imemoriais chamavam de Amor.

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