terça-feira, 10 de maio de 2011

Passos de um andarilho

Pés que andaram tantas vezes por aquelas ruas tão conhecidas tão suas rumavam por caminhos impessoais, sem história. Não era tarde, mas já não sabia mais o destino de seus passos. Reconhecia o local mas já não parecia fazer parte dele.
"Há quanto tempo" pensou. Fechou os olhos para sentir a brisa e ouvir o barulho das folhas sendo levadas pelo vento, parecia a primeira vez. Não entrou na galeria, estava bom ali fora, entre as sombras das árvores, os ventos e alguns pássaros.
Ignorava as pessoas e os carros.
Não era o que tinha vindo procurar, se é que buscava algo.

Andou.
Pensou que talvez se fosse descalço nalguma parte daquilo ali uma hora poderia se tornar familiar. Acalme-se disse a si mesma, é apenas um lapso.

Andou sem rumo, olhando em todas as direções. Via tudo, ou nada.

Parou cansada. Quando se deu conta de onde tinha vindo parar se admirou e esboçou um meio sorriso.
Na beira da água.
Um rio caudaloso corria à sua frente e como num quadro perfeito que só a visão real, humana, clara e limpa desfrutaria, um pôr-do-sol atingia seu ápice guardando alguns traços na memória daqueles que tal fenômeno, um tanto banal pros moradores da cidade, presenciaram.

Sentou-se, quando a vontade era de deitar livre das convenções humanas.
Livre. Água. Fênix.
Como não lembrar. Havia um tempo deixara de usar o pseudônimo, conhecido por si e alguns poucos próximos. A metáfora perfeita de si mesma. A fênix que renasce num ciclo real, num elemento que sempre tomara como seu. O ciclo da natureza da água se manifestando num ser mitológico , representando a vida em ciclos, Uroborus.
Carrego uma fênix no peito, enquanto tento carregar um mundo nas costas.
Estava tão cansada. Não de tudo, mas sim de todos. Tantos problemas pra carregar nas costas, mal resolvia os seus, parava pra ouvir os dos outros, nada podia fazer a não ser soltar umas palavras de conforto e acabava por se sentir extremamente impotente.
Começou a lembrar de umas conversas antigas e sentiu saudade de um silêncio compartilhado.
Começou a pensar em umas conversas recentes e pensou que era melhor mesmo estar sozinha. Não teria que justificar o silêncio ou puxar assunto, não teria olhos curiosos em cima de seus pensamentos, não teria que se corrigir ou explicar um ponto de vista.
Quem visse aqueles olhos vazios jamais pensaria que por dentro se passavam tantos pensamentos. Deixou irem. Um por um. Não eram seus, não precisava daquilo.
Ficou apenas com uma cena, que ela mesmo havia criado. Um desenho mental que era como a personificação de uma sensação de uma conversa aconchegante. Era uma menina alegremente melancólica. Um tanto insegura. Sentava-se perto de um menino mal-humorado, impaciente e descontente. Conversavam sobre tudo e nada. Sorriam ainda que soubessem que ali estavam cansados desfrutando de besteiras só pro tempo passar e as coisas melhorarem. Era sempre o que esperavam. Ainda que fosse tudo só silêncio a sensação era confortante, como se finalmente ela tivesse achado o que procurava em seus passos andarilhos, seu espaço no mundo.