domingo, 20 de março de 2011

T.

T. foi o homem mais menino e mais velho que conheci. E foi um enorme prazer conhecê-lo. Era um homem em seus vinte e tantos anos, aparentemente normal, ou não. Nunca o vi andar pela orla da praia, mas tenho certeza que o fazia, e que se um dia o olhasse não seria normal. Imagino que suas sobrancelhas chamem atenção lhe dando um ar de maldade e desgosto da vida que não eram de todo erradas. Mas também imagino que num surto de andarilho por ruas tão desconhecidas e tão suas tal expressão suavizasse na beira-mar, quando por um acaso ele resolvesse parar.
Quando novo ergueu seu coração ao céu: entre igrejas e túmulos talvez buscasse a aprovação divina, a alma em troca de um pouco de compaixão do senhor dos destinos.
Quando mais jovem estendeu seu coração à frente, como um menino encabulado que estende uma rosa a uma professora, a uma prima ou à vizinha da rua de cima. Era um menino tão bobo com o Amor. Cada amor seu foi cultivado com o zelo das mais belas flores dos jardins mais secretos, e sorria com isso. Era como se com tanto zelo houvesse fé suficiente para acreditar que daquela vez, em cada uma das vezes, não ia dar errado. Mas dava. E isso matava pedacinhos do jardim de um menino bobo que a cada perda ia diminuindo seu jardim, seus investimentos nas flores, mas nunca seus cuidados. E por isso sorriu com pouco, e chorou por tudo. Viu não querendo crer, sentiu a parte mais insensível do mundo, protestou para todos os deuses do passado, chorou por si, pra si, gritou pro universo surdo, mas jamais se conformou com seu chão caindo uma, duas, inúmeras vezes. Em seus vinte e tantos anos ou menos já andava encurvado. Agora ele não erguia o coração, muito menos o estendia, na verdade o escondia. Entre ombros largos carregando por vezes o peso de Atlas e joelhos por vezes fracos e doloridos demais pra tanto peso, protegia um coração que ainda pulsava tão forte quanto ele mesmo no mundo. Era o que chamava de surtos. Pulsava como um louco e talvez realmente o fosse. Era sincero, por vezes irônico e desnecessariamente estúpido, mas era certo, o que escandalizava os demasiadamente hipócritas, irritava profundamente os conformistas e encantava os outros loucos. Sua metáfora perfeita seria: se o universo fosse um grande coração que parou de bater, seus comentários, absurdamente sinceros, seriam choques que talvez um dia fizessem o universo lhe responder, chamar por vida. Quando cansado demais se resguardava em seu pequeno grande universo próprio, que se resumia a desenhos, livros, músicas, paredes brancas, quartos escuros, noites em claro, viagens com seu par de amigos cama e teto, tudo que lhe fazia realmente bem, ou pelo menos tudo que não ia lhe machucar. Afinal, era seu universo, um local com o qual sempre poderia contar, ao contrário de um par de braços que oferecia o mundo e tudo que há de mais por sua companhia, e quando a tinha ia embora deixando o vazio, a saudade e a dor. Era um velho de conhecimento quem sabe mais velho ainda de dores, experiências. Cheio de histórias suas e dos outros com ou sem menor sentido, amáveis ou amargas, por vezes surreais demais.
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Um paradoxo Humanamente normal, pessoalmente excêntrico, curiosamente atraente.
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Admitidamente ingrato, pra mim ainda era mais que um cara legal e estranhamente insano.
T. era mais que um Amor de pessoa, era o Amor em pessoa, era o homem que eu amava.

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P.S.:Favor não fazer nenhuma relação de ordem cronológica. O texto é mais antigo do que parece.

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